Os manifestantes da COP26 apoiam causas conectadas pelas mudanças climáticas
Glasgow, Escócia – Desafiando o forte vento e a chuva constante, dezenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas de Glasgow em um sábado recente em protestos barulhentos e coloridos, pedindo aos líderes globais que tomem medidas drásticas o suficiente para enfrentar uma crise climática que já causa estragos em partes do mundo.
Agitando faixas, batendo tambores e cantando, inúmeros manifestantes – incluindo membros de sindicatos e organizações religiosas, além de grupos de esquerda – tomaram grande parte da cidade escocesa, que sediou a cúpula climática da COP26. No meio da tarde, uma longa fila de pessoas andava pela cidade, e no fim da tarde elas ainda estavam entrando em um parque da cidade, o Glasgow Green, para ouvir discursos de ativistas.
O protesto mostrou como a batalha para conter as mudanças climáticas abrange um crescente movimento de protesto que visa colocar os líderes globais sob pressão por uma ampla gama de causas, incluindo justiça racial e igualdade de renda.
“Não devemos subestimar a importância de como o movimento climático chegou às massas nos últimos dois anos, porque está realmente começando a mudar a consciência das pessoas. Acho que é mais importante do que o que acontece dentro da reunião da COP, pois está impondo o tipo de pressão necessária para forçar os governos a agir, e também para assumir posições muito mais radicais do que pretendem”, disse Feyzi Ismail, professora de política global e ativismo na Goldsmiths, Universidade de Londres.
Muitos dos manifestantes afirmaram se sentir motivados por uma conexão com sua vida. “Inundações estão acontecendo, e vão continuar”, disse Alexandra Bryden, de 63 anos, estofadora e fabricante de cortinas de Auchterarder, ao norte de Edimburgo, que contou que sua oficina havia sido inundada e que se preocupava com o futuro de seus familiares que vivem na costa.
De acordo com alguns organizadores, mais de 200 eventos foram planejados em todo o mundo, com mais da metade desse número na Grã-Bretanha. Em Londres, milhares marcharam do Banco da Inglaterra à Trafalgar Square, e houve protestos em outras cidades inglesas, incluindo Birmingham e Bristol.
Em Paris, centenas de manifestantes se reuniram em frente à Prefeitura, onde ativistas ergueram retratos de líderes mundiais e os acusaram de fazer muito pouco para conter o aquecimento global. Leu-se a lista dos líderes, incluindo o presidente Joe Biden e o presidente Emmanuel Macron, da França, e esta foi vaiada pela multidão.
Mas o foco naquele sábado foi em Glasgow, onde várias dezenas de ruas foram fechadas para controlar os protestos. “As pessoas estão vindo para a rua com este tempo para dizer que já tivemos o suficiente. As coisas têm de mudar antes que sejamos extintos – porque é isso que vai acontecer em longo prazo”, afirmou Robert Dickie, de 64 anos, contador aposentado de Hamilton, na Escócia, perto de Glasgow, que usava um kilt e tocava sua gaita de foles.
Contudo, apesar do mau tempo, havia um clima animado na maior parte da marcha, que foi o ápice dos protestos menores promovidos ao redor da cidade. Houve uma grande manifestação liderada por jovens, organizada pelo grupo Fridays for Future, movimento internacional que surgiu da greve escolar de Greta Thunberg em 2018. Ela se dirigiu à multidão e descreveu a COP26 como “um fracasso”.
Na primeira semana da cúpula climática, houve novas promessas para combater o desmatamento e abandonar o uso do carvão. Pelo menos 105 países assinaram um acordo para reduzir as emissões de metano, potente gás do efeito estufa, em 30 por cento nesta década. As principais instituições financeiras anunciaram que mobilizariam trilhões de dólares para ajudar a mudar a economia global para uma energia mais limpa.
Ainda assim, especialistas observam que, para evitar os piores efeitos das mudanças climáticas, o aumento da temperatura precisa ser limitado a 1,5 ºC entre os tempos pré-industriais e o fim deste século. E esse objetivo não será alcançado, mesmo que todos os países cumpram suas promessas atuais.
Como muitos grupos ambientais, os manifestantes em Glasgow estavam céticos em relação às promessas, duvidando que fossem cumpridas e argumentando que, de qualquer maneira, não eram suficientes para resolver um problema global urgente.
Bel Burn, de 59 anos, profissional de saúde aposentada da Cumbria, no norte da Inglaterra, disse que estava protestando porque se opunha à agricultura intensiva, e descreveu como havia comprado oito hectares, nos quais planejava plantar 4.200 árvores. “Eles não foram longe o suficiente. Já haviam acordado muitas dessas coisas antes; por que acreditaríamos que seria diferente desta vez?”, comentou, referindo-se aos líderes globais.
Stuart Graham, funcionário de sindicato em Glasgow e membro da Coalizão COP26 que organizou os protestos, afirmou esperar que a marcha reforce as campanhas pelo transporte público gratuito e por um enorme programa para isolar e melhorar a oferta habitacional da cidade. “É fundamental que tenhamos uma sociedade civil com uma voz poderosa para responsabilizar esses líderes.”
Os organizadores argumentam que a desconcertante gama de grupos com diferentes agendas está unida por um compromisso comum, que chamam de justiça climática.
Katia Penha, uma das ativistas, que faz parte de uma comunidade quilombola, grupo de moradores negros rurais do Brasil, contou que sua comunidade foi afetada pela mineração e quer que seus desafios sejam reconhecidos ao lado de comunidades indígenas que são desproporcionalmente impactadas. “Viemos aqui para dizer ao mundo: sem nós – o povo quilombola no Brasil –, não é possível ter um debate sobre as mudanças climáticas”, declarou ela, mencionando como uma barragem rompida em 2015 em Mariana, no Brasil, matou quilombolas e aniquilou comunidades.
Em outros lugares, ativistas veganos carregavam balões de uma vaca e uma galinha com a mensagem: “Obrigado por não nos comer”. Em uma encosta, um grupo escreveu “Amazônia para sempre” com tiras de pano acima da imagem de uma borboleta, chamando a atenção para a destruição da floresta.
Ismail, a professora da Goldsmiths, disse que a questão para o movimento de protesto era se ele poderia estender sua influência ao se unir a sindicatos e persuadir trabalhadores a usar a ameaça de greve para levar adiante uma agenda coerente. Mas frisou que já havia progressos. “O movimento de protesto é a única coisa que vai mudar a situação. Se não houver pressão, não haverá mudança.”
c. 2021 The New York Times Company