Hospital Regional – Marido tira oxigênio e foge para ver esposa também com covid

Nem o oxigênio foi capaz de segurar o zelador Valdemir Antônio Gonçalves de Souza, de 49 anos, no quarto. Casado há 30 anos com Albertina Luiza Flores, de 48 anos, ele cronometrou quanto tempo aguentaria ficar sem oxigênio para subir até o quarto da esposa. Internados com covid-19 no Hospital Regional, em Campo Grande, a fuga, digna de roteiro de novela, aconteceu na tarde dessa sexta-feira (14) e foi mais uma das provas de amor entre “Gordinho” e “Brotinho”, os apelidos carinhosos do casal.

Quem conta a história entre lágrimas e risos é a filha Juliana Estefany Souza, de 28 anos. Depois do susto que levou e da bronca que deu no pai, ela enxergou que o gesto trouxe melhora no quadro de saúde dos dois.

O primeiro a pegar covid da família foi o avô de Juliana, pai de Albertina e sogro de Valdemir. Enquanto a filha cuidava dele, também se contaminou com a doença e passou para o marido.

“Meu avô internou, minha mãe foi cuidar dele, e pegou, aí meu pai foi cuidar dela e pegou”, descreve Juliana. Empresária, ela mora em Natal, no Rio Grande do Norte, mas assim que a mãe precisou internar, ela pegou o primeiro voo de volta.

Albertina começou com os sintomas e procurou a UPA no dia 6 de maio, quinta-feira da semana passada. Internou no posto e foi transferida para o Hospital Regional no sábado, dia 8.

Com o quadro considerado grave, da entrada no hospital, Albertina foi direto para o CTI. Doente renal crônica, “inexplicavelmente”, nas palavras da filha, a mãe não precisou ser intubada e passados quatro dias, saiu do CTI e foi para o quarto.

O pai, Valdemir, que inicialmente estava tratando da doença em casa, foi levado às pressas para o posto de saúde quando a filha percebeu que ele estava com os lábios roxos. “Do jeito que ele chegou, já internou e a médica pediu vaga para o Regional’, recorda Juliana. A internação no posto aconteceu na segunda-feira (10) e a transferência para o hospital na quinta (13).

“Meu pai não tinha visto ela desde o dia em que ela ficou internada, então ele perguntou de todos os jeitos e conseguiu descobrir o quarto dela”, relata Juliana. Valdemir estava no quarto andar e a esposa, no sétimo.

No quarto que ficava exatamente em frente para o elevador, o marido sabia que três andares separavam o casal, alguns metros e a necessidade dele ficar no oxigênio constantemente.

“Ele passou o dia inteiro cronometrando quanto tempo o elevador levava para chegar do quarto até o sétimo andar e quanto tempo sem oxigênio ele aguentaria em pé para ir até o quarto dela”, narra.

Juliana recebeu autorização para ir visitar e cuidar da mãe já no quarto. Como os pais estavam sem celular, ela pegou o contato do colega de quarto de Valdemir e mandou uma mensagem para ele, pedindo que dissesse ao pai que ela iria ficar com Albertina e que se desse, daria uma “escapadinha” para vê-lo.

Apesar de Valdemir saber pelas enfermeiras que a esposa estava bem, ele não se contentou apenas com a mensagem. Precisava ver a mulher com os próprios olhos e abraçá-la.

O trajeto é longo, e nas palavras da filha, o pai precisou andar bastante. “Ele disse que ia dar certinho para chegar no leito e pegar o oxigênio dela, e que era só para ele vê-la”. Com um copo de água nas mãos, o pai contou à filha que fingiu que ia até a lixeira para que os enfermeiros não desconfiassem e assim que a porta do elevador abriu, ele entrou.

“Ele sabia que iriam barrar ele, então diz que ficou com o copo de água na mão para jogar no lixo”, detalha a filha.

Juliana havia acabado de chegar ao quarto da mãe quando olhou para trás e viu o pai. “Eu disse: ‘meu Deus, da onde o senhor veio?’ E ele só juntou uma mão com a outra, quase que desfalecendo e pediu: ‘deixa eu ver ela’”, reproduz a filha.

O marido abraçou e beijou a esposa sem dar muita bola para o exército de enfermeiras que estavam desesperadas atrás do paciente em fuga. “Eu falei: ‘pai, pelo amor de Deus, você está com oxigênio’ e ele me disse: ‘calma, filha, o pai tá bem, eu cronometrei tudo, tenho mais alguns minutos’”.

Sem ter o que fazer diante da fuga, os profissionais deixaram o abraço acontecer e foram correndo pegar uma cadeira de rodas para levar o paciente de volta ao quarto.

Albertina ficou assustada de ver o marido fugitivo, mas abriu um sorriso quando ouviu a declaração de amor.

“Ele disse: ‘meu brotinho, eu te amo e vim falar para você que estou te esperando, você é o amor da minha vida e a gente vai sair daqui junto. Eu estou logo ali embaixo. Vamos ficar ainda muitos anos casados’”, relata a filha.

Neste momento o casal chorou e quem assistia a cena também.

Depois da fuga, a filha deixou um celular com cada um deles para que a comunicação fosse por chamada de vídeo. A preocupação agora é que Albertina pode ter alta primeiro, e como eles vão fazer para segurar o pai no hospital passou a ser uma questão.

“Eu falei pra ele que ia dar um jeito de prendê-lo. Mas ele me disse que tinha muito medo de morrer e não ver a minha mãe. Ele repetia que só queria ver o Brotinho dele nem que fosse pela última vez. Ontem ele quis provar o amor dele, eu não sei se ele achou que não fosse sobreviver”, acredita a filha.

 

O avô de Juliana segue internado na Santa Casa, mas com previsão de sair também. “Depois do susto, eles ficaram melhores, sabe? Até deram uma corada no semblante”, notou Juliana. (CAMPO GRANDE NEWS)

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