Guerra na Fronteira: a rota estratégica da droga no mundo

Essa proximidade e facilidade até gerou um gentílico não-oficial para quem é da região. São os “brasiguaios”: pessoas que nasceram no Brasil e vivem no lado paraguaio, e vice-versa.

Há décadas, a geografia da fronteira é explorada por organizações criminosas de todos os tipos para movimentarem seus negócios, seja de contrabando de bebidas e eletrônicos a armamentos de guerra e drogas.

Para as autoridades policiais, a região tornou-se estratégica para remeter ao Brasil a cocaína produzida na Bolívia, no Peru e na Colômbia. Soma-se a isso a produção de maconha em solo paraguaio destinada ao mercado brasileiro.

De lá, a droga segue pelo interior do Brasil, principalmente com destino às principais metrópoles da região Sudeste: São Paulo e Rio de Janeiro.

Uma parte abastece o consumo de drogas local e uma outra quantidade continua uma longa viagem por portos e aeroportos até chegar a países da Europa, Ásia, África e Oriente Médio, onde o preço do quilo da cocaína, por exemplo, pode chegar a 150 mil dólares, o equivalente a R$ 795 mil.

Fiscalização frouxa

Nossa equipe percorreu 300 km de estradas do lado paraguaio e constatou que a fiscalização em rodovias no país vizinho é praticamente inexistente.

Essa ausência de fiscalização é endossada por depoimentos de agentes públicos dos dois países que trabalham na região e que preferem manter anonimato. Eles afirmam que boa parte da droga atravessa o território paraguaio sem enfrentar grande resistência.

A Ruta V é um bom exemplo do que contam os policiais: são 577 km de estrada que cortam o Paraguai, fazendo a interligação com a Bolívia com a Ruta IX, praticamente sem nenhuma fiscalização. Lembrando que a Bolívia é um grande produtor de cocaína.

Os postos da Polícia Nacional Paraguaia são vistos com frequência, mas muitos deles estão abandonados, ou com pouquíssimos policiais. À noite, a fiscalização desaparece.

Já do lado brasileiro, a fiscalização é mais intensa. É comum encontrar postos de bloqueio de agentes do DOF (Departamento de Operações de Fronteiras) da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul nas rodovias estaduais e da PRF (Polícia Rodoviária Federal) nas rodovias federais.

Em dois momentos, a equipe da RecordTV presenciou a apreensão de duas carretas, uma com 150 quilos de cocaína, apreendida por uma equipe do DOF, e outra com nove toneladas de maconha, apreendida pela PRF.

Na carreta com cocaína, com placas do interior de São Paulo, a droga foi escondida em bujões do sistema de ar do veículo. Uma pequena marca de solda gerou desconfiança para os policiais. Quando removidos, cada um dos dois bujões tinha entre 70 e 80 kg de cloridrato de cocaína, sua versão em pó, pronta para consumo e fracionamento.

Na segunda apreensão, a PRF apreendeu nove toneladas de maconha que estavam escondidas em uma carga de milho e prendeu o motorista da carreta. Para despistar a polícia, ele contava com apoio de outro caminhoneiro que seguia na frente, mas foi parado, e no momento da abordagem recebeu uma ligação do comparsa que transportava a droga perguntando se a situação estava segura para prosseguir a viagem.

Temos mais de mil km de fronteira seca com o Paraguai e precisamos ter astúcia e perícia para ter apreensões como esta

Segundo a ministra da Secretaria Nacional Antidrogas do Paraguai, Zully Rolón, em dois anos foram apreendidas 7,2 toneladas de cocaína e 9 mil toneladas de maconha.

Por outro lado, o Brasil apreendeu no mesmo período 3.402 toneladas de maconha e 294 toneladas de cocaína. E estudos apontam que, entre 30% e 50% das drogas que circulam no Brasil, entraram no país pelo Paraguai.

Boa parte da droga que chega ao Brasil pela fronteira com o Paraguai já cumpriu um longo caminho até entrar no país vizinho, principalmente a cocaína ou sua pasta base – utilizada para o refino mais tarde.

Com alto valor de mercado, segundo dados da organização Transnational Institute, a cocaína entra no Paraguai, grande parte em aviões vindos da Colômbia e Peru, e outra parte por via terrestre, vinda da Bolívia.

As portas de entrada da droga costumam ser fazendas, estradas e pistas de pouso na região de Gran Chaco, que inclui os estados do Alto Paraguay e Boquerón, no Paraguai, e dali seguem a jornada de pouco mais de 500 km até atravessar a fronteira e entrar no Brasil.

Já a maconha tem origem dentro do próprio Paraguai. Entidades internacionais avaliam que o país tem entre 6 e 7 mil hectares de terra em que são cultivadas a planta e que cerca de 20 mil agricultores tiram sua renda dessa produção.

Segundo o Transnational Institute, o Paraguai é o principal fornecedor de maconha da América Latina, e, em 2016, pode ter movimentado cerca de 709,5 milhões de dólares. Uma cifra expressiva, se compararmos a exportação de soja do país, que, no mesmo ano, rendeu 1.5 bilhões de dólares.

Em 2019, o avanço no cultivo da maconha foi potencializado com uma mudança na lei do Paraguai que legalizou a plantação da erva de olho na liberação do uso da droga em vários países e nas aplicações de derivados da cannabis para fins medicinais.

As fazendas de maconha no Paraguai, que há décadas já atraíam organizações criminosas brasileiras, agora também servem como base logística para um produto muito mais rentável: a cocaína. A droga, que vem dos países andinos até o lado paraguaio da fronteira, é despachada para os grandes centros urbanos do Brasil.

 

Depois, uma parcela significativa segue dos portos brasileiros para a Europa, África e para a Ásia.

(Portal R7)

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