Agosto Lilás – “Em briga de marido e mulher, a gente tem de meter a colher, SIM!”

Antes da pandemia, eu e meu marido estávamos indo ao restaurante numa das avenidas de Campo Grande (MS). O local estava lotado, mesas cheias, na frente de uma academia. Ao longe, avistei uma moça que tentava se desvencilhar de um cara e ele tentava impedí-la, segurando firme seu braço. As pessoas nas mesas assistiam a cena, como se tivessem numa arena romana. Foi quando ela começou a gritar: – me larga.

Dai, não tive dúvidas, ela pedia ajuda. Ligamos o pisca alerta, porque não tinha lugar onde estacionar. Eu desci do carro no meio da rua e começei a gritar: “larga ela” – enquanto meu marido se colocava no meio do casal. Ele a deixou, vendo que o circo estava montado e todos, agora, olhavam para eles. O homem, bem vestido, recuou e logo deu meia volta e foi embora.

Você deve estar pensando: “Mulher de malandro, gosta de apanhar!”; “Não se mete não, porque depois, os dois vão virar a cara para você!”; “Ele bate porque ela merece!”.

Quem nunca ouviu uma dessas?

Pois é, por detrás do jargão popular, a realidade é bem mais dolorosa. Dolorosa para a mulher que apanha e para os filhos que crescem em meio ao sofrimento. Dolorosa, porque se o ciclo não é quebrado, se a mulher não consegue se libertar, provavelmente os filhos também serão futuros algozes e as filhas, as próximas vítimas. Ou pior, essa mulher pode perder a vida num rompante de fúria do homem agressor, deixando crianças órfãos de pai e de mãe.

Por mais que tenhamos avançado nas redes de proteção às mulheres vítimas de violência com leis e campanhas, nada será suficiente se nós (eu e você) não tivermos ATITUDES para ajudar quem precisa e não se encontra em condições de pedir ajuda.

Muitas mulheres (ricas ou pobres) que são agredidas não têm coragem de denunciar seu agressor por inúmeras razões: MEDO (a próxima vez pode ser mais doida), VERGONHA (da família, dos amigos), NÃO TER PARA ONDE IR, DEPENDÊNCIA FINANCEIRA ou EMOCIONAL, enfim, o que não faltam, são motivos para que esses jargões populares estejam na ponta da língua.

A moça que estava sendo agredida tremia muito, pensei que ela fosse cair. Era jovem, de roupas de grife, bem maquiada, tentava se controlar para não desabar no choro. Eu a abraçei e ela me disse que tinha acabado de flagrar o marido com outra num dos restaurantes do local. Conversamos um pouco, perguntei se ela queria que chamássemos alguém, ela disse que ficaria bem. Eu segurei seu rosto e disse: Você vale muito mais que “isso”!

O que me surpreendeu nessa história foi a passividade da plateia, dos expectadores que aguardavam ansiosos e impassíveis o desfecho de uma cara que segurava uma mulher contra a sua vontade, SEM FAZER nada, sem uma atitude, um grito de: Pare ai!, deixa ela!

Quando falo da minha e da sua cumplicidade no ciclo de violência contra a mulher ou contra qualquer SER HUMANO, falo da NOSSA OMISSÃO, das vezes em que estamos vendo e sentindo que há algo de errado na casa do vizinho, nas marcas nos rostos e braços da amiga, nos arranhões encobertos por roupas largas e engolimos as “desculpas” que sabemos não serem verdades, das vezes em que os olhos de alguém se enchem de lágrimas e a voz cala porque não há mais forças para o pedido de socorro.

 

Não faltam campanhas e nem leis para protegerem as mulheres da violência, falta EMPATIA, amor ao próximo, falta fechar os olhos e imaginar um só instante que quem apanha não gosta e nem é “mulher de malandro”, mas poderia ser sua irmã, sua mãe ou sua filha.

Por Suki Ozaki

 

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