Richard Branson planeja uma série de investimentos no Brasil
O prólogo da conversa da Forbes com Richard Branson, de 69 anos, foi um encontro com Carly Navin, parte da equipe de comissários de bordo da Virgin Atlantic que acompanha o magnata em eventos pelo mundo. Vestindo o uniforme vermelho assinado por Vivienne Westwood, a londrina tinha participado de um café da manhã com o chefe. “Quando estou com Richard, sempre ouço alguma história incrível que ele viveu, ou insights que ficam comigo por muito tempo”, relata Carly. “Depois de falar com ele, é comum ficar com uma enorme vontade de empreender – e ter a absoluta certeza de que é possível fazer qualquer coisa.”
O magnetismo do bilionário inglês é imenso, bem como a demanda por beber da fonte de experiências e de visão de um dos empreendedores mais bem-sucedidos do planeta. Isso se confirmou na visita mais recente de Branson a São Paulo para promover os voos da Virgin Atlantic, que começam a operar entre Cumbica e Londres em 29 de março. Os voos serão diários em um Boeing 787-9 Dreamliner, uma das aeronaves mais recentes da companhia. Vão decolar de Cumbica às 15h55 e pousar em Londres às 7h20. Da capital inglesa para São Paulo, sairão às 22h30 para chegar às 6h25.
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“Deveríamos ter vindo para o Brasil há muitos anos. Quando se analisa a economia do país, os resultados não são bons, mas todos os países têm seus próprios problemas”, pondera Branson, prevendo que sua empresa abalará as estruturas do setor de aviação nacional. “As duas empresas com as quais iremos competir [Latam e British Airways] são efetivamente um monopólio, empresas que precificam e trabalham juntas. Temos competido com monopólios há 35 anos, oferecendo produtos melhores e focando nos pequenos detalhes. Temos tido sucesso.”
Conhecido por seu fascínio pela resolução de problemas, o empreendedor foi apresentado a um dos desafios do Brasil assim que chegou: o trânsito caótico da capital paulistana. A dificuldade em conseguir um helicóptero resultou em uma viagem de carro de quase três horas entre Guarulhos e o hotel Four Seasons, na zona sul.
“Não sei como as pessoas conseguem viver nessas circunstâncias. Provavelmente, muitas delas passam até cinco horas no trânsito todos os dias, e essa não é uma existência que eu gostaria de ter”, confessa Branson, que mora na tranquila ilha de Necker, nas Ilhas Virgens Britânicas. “Mobilidade é uma área na qual poderíamos ajudar o Brasil
nos próximos anos. Precisamos construir o Virgin Hyperloop One ao longo da rodovia, um trem que vai reduzir o trajeto [de Cumbica até a capital] para 20 minutos”, afirma, referindo-se ao trem de alta velocidade que a Virgin vai construir entre as cidades indianas de Mumbai e Pune.
Essa é apenas uma das diversas oportunidades identificadas pelo bilionário no Brasil. Segundo ele, o começo da operação da Virgin Atlantic será o ponto de partida para negócios em outras divisões do grupo que poderão vingar no país. Tendo iniciado sua vida nos negócios depois de abandonar a escola aos 16 anos de idade, Branson é um grande
aliado de iniciativas de apoio a jovens empreendedores. O grupo britânico pretende lançar no Brasil a Virgin Startup Loans, projeto que já concedeu milhares de empréstimos e mentoria de negócios em locais como o próprio Reino Unido e a África do Sul. “Se o governo estiver interessado em trabalhar conosco, definitivamente ficaríamos muito felizes em trazer o programa para o Brasil.”
Ele também é um crítico da educação formal, e diz que o empreendedorismo pode trazer parte da solução para outro problema do Brasil: o desemprego de mais de 11 milhões de pessoas, 30% delas jovens entre 18 e 24 anos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): “Pessoas que administram seus próprios negócios certamente aprendem mais do que na escola ou mesmo na universidade”, analisa.
Emergência climática
Apaixonado por causas relacionadas à preservação ambiental (a Virgin deixou de servir carne vermelha em seus voos em 2018) e um dos personagens mais influentes no mundo de negócios no debate sobre mudanças climáticas, a expectativa é que Branson use a presença de sua companhia no Brasil para aumentar sua influência nessa agenda.
“Não consigo pensar em nada mais triste nesse mundo do que ver a floresta amazônica sendo queimada. É uma joia preciosa que existe neste país, e temos que fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para protegê-la”, afirma. Ele sabe que, apesar dos diversos e complexos problemas a serem endereçados quando o assunto é meio ambiente, o benefício financeiro da Amazônia, se mantida intacta, é de US$ 8,2 bilhões, segundo a revista científica “Nature”. Por isso, tem intensificado seu lobby para que a emergência climática fique óbvia para governos e a elite dos negócios em diversos países. Branson tem tentado encampar o equivalente a um imposto sobre carbono para que empresas invistam a totalidade desses recursos em projetos de energia renovável.
“Estamos tentando convencer governos a fazer com que empresas invistam uma porcentagem de seus lucros em energia limpa com base em suas emissões de carbono”, ressalta. “Se [essa contribuição] fosse imposta a todas as empresas, conseguiríamos resolver o problema de mudança climática muito rapidamente. Estamos trabalhando para que isso aconteça.”
Ativamente envolvido em múltiplos compromissos filantrópicos (que incluem a limpeza dos oceanos e o combate à miséria), Branson aplaude o crescente foco corporativo no Brasil em aplicar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas, o que vai ao encontro de sua opinião de que empresas devem se responsabilizar pelo tratamento de temas importantes para a humanidade.
“Todas as empresas no mundo deveriam agir de forma concreta para resolver diversos problemas sérios que o mundo enfrenta. Não podemos deixar isso para políticos que geralmente permanecem em suas funções por 18 meses”, adverte.
“Precisamos que empreendedores preencham essas lacunas.”
Sobre seu próprio negócio, Branson aceita que as pessoas não vão parar de viajar de avião, mas quer que a oferta seja o mais sustentável possível: a Virgin Atlantic tem a meta de atingir a neutralidade nas emissões de carbono em 2050, com iniciativas como aviões com baterias em voos domésticos e a adoção de tecnologias que reduzem o consumo de combustíveis fósseis.
Corrida espacial
Avaliada em mais de US$ 2 bilhões, a Virgin Galactic foi a primeira empresa de transporte espacial a estrear na bolsa, em 2019. Desde então, teve uma queda nas ações e agora depende do lançamento de sua oferta de viagens suborbitais, que inclui turismo e missões espaciais, para chegar ao break-even em 2021.
A trajetória para fazer com que viagens ao espaço se tornem relativamente corriqueiras enfrenta desafios por mais de uma década. Em fevereiro de 2019, a Virgin atingiu seu mais recente marco, com a nave VSS Unity chegando à altitude máxima de 89,9 quilômetros e levando uma passageira, Beth Moses, além dos dois pilotos. Primeira mulher a embarcar num voo espacial comercial, a astronauta flutuou no interior da nave, assim como farão os futuros passageiros.
A Virgin não revela quem está em sua lista de turismo espacial, mas existem brasileiros entre as mais de 600 pessoas que desembolsaram US$ 250 mil para garantir um lugar na fila, como o fundador de uma das maiores startups do país. O empreendedor, que pediu para permanecer anônimo, acha que a Blue Origin, de Jeff Bezos, lançará sua oferta comercial antes. Branson rebate a previsão: “Já provamos que estamos à frente da Blue Origin. A única razão pela qual não estamos levando pessoas [comercialmente para o espaço] hoje é que queremos fazer mais voos de testes com pilotos para ter 100% de certeza de que ofereceremos um voo de ida e volta”, enfatiza.
O fundador da Virgin também garante que não se preocupa com Elon Musk, que quer levar humanos para Marte com seu projeto SpaceX. “Nós dois estamos fazendo coisas bem diferentes. A Virgin Galactic foi a primeira a colocar pessoas no espaço, e é isso que chamo de roubar a cena.”
As ambições de Branson fora do planeta, no entanto, vão além do turismo. A ideia é avançar a Virgin Orbit, que lança pequenos satélites sob demanda para clientes que incluem a Nasa. Os satélites têm funcionalidades como monitoramento climático, serviços de observação e telecomunicações, essa última sendo uma das vertentes mais promissoras do negócio.
“Existem 4 bilhões de pessoas na Terra que não estão conectadas e, a não ser que usemos satélites ao redor do planeta, esse problema permanecerá”, comenta, sem perder a chance para alfinetar a competição: “A abordagem da Virgin é, em vez de ir passear em Marte, usar o espaço para melhorar nosso planeta.”
Reportagem publicada na edição 75 da Revista Forbes