‘Primos’ do novo vírus encontrado na China são conhecidos por alta taxa de letalidade em humanos
A notícia de que pesquisadores haviam detectado um surto do novo vírus Langya em 35 pessoas na China acendeu mais um alerta na comunidade científica nesta semana, mas isso não significa que haja, neste momento, uma ameaça real à população.
O estudo que fala do vírus Langya (LayV), publicado na revista The New England Journal of Medicine, relata casos ocorridos entre 2018 e 2022 nas províncias de Shandong e Henan.
A descoberta se deu em monitoramento de rotina (vigilância sentinela) que submeteu a uma análise genética amostras coletadas da garganta de pacientes com quadros febris e histórico recente de exposição a animais no leste da China.
Encontrou-se, então, esse patógeno cuja estrutura genética é feita de RNA e é da mesma família (Paramyxoviridae) de outros dois vírus mais conhecidos: o Hendra e o Nipah.
Segundo os CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças) dos Estados Unidos, a taxa de letalidade do Hendra é de 57%, “de sete casos humanos conhecidos, quatro foram fatais”.
Já o Nipah, entre 40% e 70% dos humanos infectados morreram, mas o índice de fatalidades chegou em 100% em alguns surtos, destaca o órgão.
Um cenário um pouco diferente parece ter ocorrido com o Langya, já que os autores não descreveram nenhum óbito entre os casos analisados.
Os principais sintomas foram: febre (100%), cansaço (54%), tosse (50%), perda de apetite (50%), dor muscular (46%), náusea (38%), dor de cabeça (35%) e vômitos (35%), acompanhados por anormalidades de baixo nível de plaquetas (35%), baixo número de glóbulos brancos (54%) e redução da função hepática (35%) e renal (8%).
Parentes
Além de serem da mesma família, Hendra, Nipah e Langya são do mesmo gênero: Henipavirus.
“Dos 5 Henipavirus spp. identificados, o vírus Hendra e o vírus Nipah são patógenos emergentes altamente virulentos que causam surtos em humanos e estão associados a altas taxas de letalidade. Três espécies adicionais — vírus do cedro, vírus do morcego de Gana e vírus Mojiang — não são conhecidas por causar doenças humanas”, destacavam os CDC antes da descoberta do Langya, que passa a ser o sexto Henipavirus.
Todos vírus são zoonóticos, o que significa que vivem em animais. Os hospedeiros naturais dos Henipavirus são os morcegos frugívoros pteropídeos, conhecidos como raposas voadoras. Neles, o patógeno não causa doença.
A infecção em humanos se dá por meio de hospedeiros intermediários, e não diretamente dos morcegos. No caso do vírus Hendra, os CDC descrevem que as infecções em pessoas ocorreram por meio do contato com cavalos infectados após exposição à urina de morcegos.
Já o Nipah é transmitido pelo contato de humanos com porcos ou tecidos de porcos infectados por morcegos.
“A transmissão de pessoa para pessoa do vírus Nipah foi relatada através de contato próximo (incluindo gotículas respiratórias) com pessoas infectadas. A transmissão é facilitada por práticas culturais e de saúde nas quais amigos e familiares cuidam de pacientes doentes”, acrescenta o órgão sanitário dos EUA.
Os surtos do vírus Hendra ocorreram na Austrália entre 1994 e 2016, todos restritos à costa nordeste da Austrália. Os sete casos de infecção em humanos ocorreram “particularmente por meio de contato próximo durante o atendimento ou necropsia de cavalos doentes ou mortos”, ressalta a OMS (Organização Mundial da Saúde).
O vírus Nipah foi identificado pela primeira vez entre produtores de porcos na Malásia. Posteriormente, apareceu em Bangladesh, onde “surtos anuais ocorrem desde então”, informa a OMS. Também houve registro da doença periodicamente no leste da Índia.
Tanto o Nipah como o Hendra podem evoluir para um quadro semelhante a uma gripe grave. O quadro se inicia com febre, dores no corpo e de cabeça e tontura.
“Isso pode progredir para encefalite [inflamação no cérebro] grave com confusão, reflexos anormais, convulsões e coma; sintomas respiratórios também podem estar presentes. A encefalite recidivante ou de início tardio pode ocorrer meses ou anos após a doença aguda”, observam os CDC.
Risco
Apesar de serem vírus zoonóticos, o histórico desses três vírus demonstra que animais que convivem com humanos precisam estar distante da vida selvagem.
O desmatamento, com avanço de áreas urbanas ou de fazendas para regiões de florestas, além das mudanças climáticas, são apontados frequentemente por especialistas como um risco para o surgimento de novos patógenos.
Assim com o vírus Hendra, não há relato de transmissão entre humanos do Langya, salientaram os autores do estudo.
“O rastreamento de nove pacientes com 15 familiares próximos não revelou transmissão de LayV por contato próximo, mas o tamanho da amostra foi muito pequeno para determinar o status da transmissão de humano para humano para LayV.”
Vírus de RNA são conhecidos por sua rápida capacidade de mutação e adaptação a novos hospedeiros. Cabe ressaltar que o Sars-CoV-2, causador da Covid-19, também era um vírus zoonótico, mas que em pouco tempo se tornou eficaz na transmissão entre humanos.
O artigo sobre o Langya termina com um alerta à comunidade científica, de que a descoberta “merece investigação adicional para entender melhor a doença humana associada”. (R7)