Parlamentares pedem à PGR federalização do caso Mari Ferrer

Entidades de defesa dos direitos humanos e das mulheres têm trabalhado intensamente no caso Mariana Ferrer, na tentativa de mudar os rumos do processo que inocentou o empresário André de Camargo Aranha, ao mesmo tempo em que buscam evidenciar e impedir que ataques como os que ela sofreu nas audiências do caso se repitam.

No dia 24 de setembro, as procuradoras da Mulher da Câmara dos Deputados, deputada Tereza Nelma (PSDB-AL), e do Senado, senadora Leila Barros (Cidadania-DF) foram até o procurador-geral da República, Augusto Aras, apresentar um dossiê completo do caso e pedir a sua federalização. O Estadão conversou com a deputada Tereza Nelma sobre os últimos acontecimentos. Veja a seguir entrevista.

Protesto teve cartazes de apoio a influenciadora digital Mariana Ferrer, alvo de acusações machistas durante audiência de processo no qual figura como vítima de estupro. © Dida Sampaio/Estadão Protesto teve cartazes de apoio a influenciadora digital Mariana Ferrer, alvo de acusações machistas durante audiência de processo no qual figura como vítima de estupro.

A senhora poderiacomentar a decisão recente do CNJ de investigar o juiz que atuou no julgamento do caso Mariana Ferrer?

A Corregedoria da Justiça estadual havia arquivado a análise da conduta do magistrado e os conselheiros decidiram reabrir a questão para verificar porque o juiz não evitou os ultrajes à vítima durante a audiência. Este é um passo importante. Estamos preocupadas com a morosidade de resolução do caso e o quanto a repercussão tem prejudicado a saúde física e mental da jovem Mari Ferrer. Por isso é importante que o CNJ reabra a análise sobre a conduta do juiz. É uma questão disciplinar essencial.

Qual o balanço das ações da Procuradoria em relação ao caso, e que avanços foram alcançados?

Enviamos 26 ofícios à diversas autoridades, apresentando o contexto dos diversos aspectos do caso e encaminhando três tipos de denúncias envolvendo a jovem Mari Ferrer: uma denúncia de estupro de vulnerável, outra de violência institucional e uma de irregularidades no inquérito policial e processo criminal.

Estas denúncias foram encaminhadas tanto ao CNJ, como para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina, além de Ministérios. A decisão do CNJ demonstra um avanço. Nossos encaminhamentos foram no sentido tanto de informar sobre o caso, como solicitar encaminhamentos, pedir audiências e celeridade aos trâmites processuais.

Nem todos os ofícios foram respondidos até o momento. A Procuradoria Geral de Justiça de Santa Catarina, por exemplo, informou, em relação à denúncia de estupro de vulnerável, que o caso está sendo apurado nos autos da ação penal que tramita na 3ª Vara Criminal da Comarca da Capital.

Em relação à denúncia de violência institucional a OAB Nacional informou que o caso está sendo acompanhado pelo Conselho Seccional da OAB-SC, e que, “tomando conhecimento dos fatos, abriu procedimento e oficiou o advogado para prestar esclarecimentos sobre sua conduta profissional. Além disso, informou que foi solicitado ao Poder Judiciário acesso integral ao processo”.

A Procuradoria da Mulher da Câmara já realizou reuniões com diversas autoridades, entre elas os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, PGR, STF e liderança da bancada feminina do Senado. Importante frisar que entre as funções das Procuradorias da Mulher está apoiar as vítimas nos casos em que elas se sintam prejudicadas quanto ao resultado ou demora de um atendimento de violência, em qualquer esfera.

Em que estágio está o projeto que cria a Lei Mari Ferrer?

Na Câmara dos Deputados, a bancada feminina apresentou dois projetos com o objetivo de coibir a violência institucional. Um é o PL 5091/2020, da deputada Soraya Santos (PL-RJ) e outros, que tipifica o crime de violência institucional. Outro projeto é o PL 5096/2020, de autoria da deputada Lídice da Mata (PSB-BA), com nossa coautoria e mais 23 assinaturas, e que proíbe o uso em audiências judiciais de linguagem, informações ou material que ofendam a dignidade da vítima ou de testemunhas de crimes contra a dignidade sexual. Os dois projetos já foram aprovados na Câmara e agora dependem da votação do Senado para virar lei.

O que foi solicitado à PGR? Qual a resposta dada pelo procurador-geral?

Nas últimas semanas, estivemos (as procuradoras Tereza Nelma e Lídice da Mata, pela Câmara, e a senadora Leila Barros, procuradora da Mulher no Senado) com o procurador-geral da República, Augusto Aras, pedindo que analise a possibilidade de federalizar o caso, uma vez que até hoje não houve conclusão. Solicitamos também que o caso de Mari Ferrer ingresse no Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão. Ainda não temos a decisão da PGR.

O que o caso representa para as mulheres brasileiras?

Infelizmente, o caso de Mari Ferrer é um entre centenas que acontecem diariamente. Não podemos permitir que as vítimas sofram duas vezes: pela violência em si, que já é traumática, e pelos constrangimentos durante audiências e julgamentos. Por isso é importante que tenhamos um resultado concreto, tanto alertando as autoridades como aprovando projetos de lei, para que situações de constrangimento e revitimização não voltem a acontecer no futuro, e sirvam de exemplo.

Como combater esse machismo tão arraigado até mesmo no Judiciário?

Infelizmente a questão do machismo é cultural e está institucionalizada. Podemos combatê-lo com ações de sensibilização, articulação com todos os órgãos do Judiciário nas esferas municipal, estadual e federal, e também com a aprovação de projetos que alterem a legislação vigente nos pontos que ainda estão vulneráveis ao enfrentamento à violência contra as mulheres.

 

 

FONTE: ESTADÃO

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