Em dois meses, Hospital do Câncer pode ficar sem tratamento de radioterapia


Por gerar uma dose de radiação significante a ponto de destruir as células doentes, o acelerador linear tem requisitos complexos – Foto: Gerson Oliveira

O Hospital de Câncer de Campo Grande – Alfredo Abrão (HCAA) corre contra o tempo para conseguir mais de R$ 11 milhões e evitar paralisação de radioterapia. Isso porque o acelerador linear, aparelho que opera com fins de tratamento, vai deixar de ser fabricado e não terá técnicos disponíveis para eventuais reparos
a partir do ano que vem.

A administração do hospital pontua que, enquanto o aparelho estiver funcionando, vai utilizá-lo no tratamento dos pacientes. No entanto, a partir do dia 1° de janeiro de 2024, um dos softwares importantes para o funcionamento da radioterapia vai sair de linha.

Se  houver um problema no sistema, não tem como a máquina funcionar, e os técnicos da fabricante não vão mais atuar em seu ajuste.

“Se houver uma intercorrência e esse software parar por alguma razão, após o dia 1º de janeiro, a fábrica não tem mais como nos ajudar. Nós estaremos sós. Só nós poderemos fazer alguma coisa por ele, e nós não somos um técnico, um hospital que tenha um corpo de software que possa resolver um problema criado na Inglaterra”, esclarece o Coordenador de Operações do HCAA, Luciano Gasparini Nachif.

A unidade hospitalar informa que, se houver qualquer tipo de problema com o aparelho, isso vai impactar cerca de 95 pacientes diariamente, que é a média de pessoas que o HCAA atende com o tratamento de radioterapia por dia.

Ao todo, Nachif relata que entre 55% e 70% dos pacientes oncológicos precisam realizar a radioterapia em algum momento do tratamento.

A média anual de pacientes que realizam a radioterapia no HCAA é de 680, mas o hospital pontua que neste ano o número de pessoas tratadas deve ficar acima, sendo aproximadamente de 800 pacientes.

Cada pessoa fica um determinado tempo realizando a radioterapia, que vai depender da quantidade de sessões que o médico determinar, e isso pode durar semanas ou até meses. No ano passado, o HCAA teve 712 pacientes atendidos na radioterapia. Já em 2021 foram 1.034 atendimentos.

Ao todo, desde 2019 – quando o equipamento começou a funcionar – até julho deste ano, foram tratados 13.463 pacientes oncológicos com a radioterapia.

EQUIPAMENTO

O aparelho que é utilizado atualmente pelo HCAA foi criado em 2010 e comprado por uma instituição de Goiás.

Após cerca de sete anos parado, foi doado para o hospital e teve sua montagem terminada em julho de 2018, a qual foi realizada por um funcionário da fábrica inglesa, responsável pela criação da máquina.

O hospital também esclarece que, para a mudança do aparelho, é necessário um tempo hábil de no mínimo um ano, pois esse tipo de equipamento não é estocado – é necessário realizar primeiramente o pagamento (US$ 1,8 milhão, cerca de R$ 9 milhões) para então a empresa fabricar o aparelho e enviar ao Brasil. Além disso, também é necessário a construção de um banker para sua instalação.

O novo equipamento também vai trazer mais agilidade para os tratamentos oncológicos. O físico Lourenço Caprioglio, que é um dos especializados para operar a máquina, relata que atualmente há novos protocolos internacionais clínicos que apontam a eficácia do novo aparelho em menos sessões de radioterapia.

“Nós estamos falando de cerca de, no mínimo, 13 a 15 anos de defasagem. Isso na medicina é muita coisa. Hoje nós tratamos alguns tipos de tumores em cerca de 45 sessões, são cinco sessões por semana, isso dão nove semanas. Em alguns casos, com a nova tecnologia, a nova máquina, nós conseguimos reduzir isso em até 13 ou oito sessões”, destaca o especialista.

O equipamento de alta tecnologia também consegue ser mais eficaz no tratamento do câncer, impactando menos em outros tecidos.

Os responsáveis pelo tratamento de radioterapia informam que boa parte dos efeitos colaterais é em virtude do impacto da rádio em outros órgãos ou tecidos, porque a precisão do equipamento é menor, de uma tecnologia fabricada antes de 2010.

“Por exemplo, você vai fazer uma radioterapia na mama esquerda. Do lado esquerdo, você tem o coração que está próximo, então eu tenho um limite máximo de dose de radiação que pode chegar. Não deveria, mas vai chegar. Com um equipamento de alta tecnologia, eu consigo fazer uma combinação melhor, ter uma precisão maior”, informa o físico.

O HCAA também pontua que a mudança na máquina traria uma economia ao Estado e aos municípios, porque hoje o hospital atende muitos pacientes de cidades do interior que precisam se deslocar até a Capital durante semanas, a fim de realizar a radioterapia. Com a melhora de eficácia da nova tecnologia, esse tempo
é reduzido.

No entanto, apesar de já terem conhecimento da situação do hospital há cerca de um ano e oficialmente terem recebido o documento relatando o problema há dois meses, o HCAA manifesta que não obteve resposta do poder público para a compra do novo equipamento.

A Secretaria Municipal de Saúde de Campo Grande (Sesau) informa em nota que tem “desprendido todos os esforços” para atender os pleitos do HCAA, “como forma de garantir a qualidade da assistência ao paciente”.

A Pasta também relata que esteve em reunião com o Ministério da Saúde, visando a solução do problema de equipamento do hospital.

A Sesau conclui que aguarda resposta sobre a possibilidade de abertura de novas vagas de financiamentos, “para aumentar a disponibilidade de instalação de novos equipamentos [acelerador linear] na rede”.

Ao Correio do Estado, a Secretaria de Estado de Saúde (SES) comunica que as unidades hospitalares filantrópicas conveniadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) têm autonomia para captar recursos federais por meio de emendas parlamentares via Fundo Nacional de Saúde (FNS), por meio do InvestSUS.

“O Ministério da Saúde já disponibilizou uma cartilha orientando às entidades a como realizar a captação de recursos federais”, argumenta a SES em nota.

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