Cantinas de presídio têm até salame liberado e faturamento supera R$ 2 milhões

Sob as bênçãos de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado com o Ministério Público, as cantinas dos presídios são território livre para o comércio de uma série de guloseimas – salaminho, pizza, bacon. Mas os itens colocam em xeque o princípio da igualdade. Afinal, preso rico terá uma alimentação diversificada.

Já o faturamento das cantinas das unidades penais de Mato Grosso do Sul vai de vento em popa. Conforme a Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário), a revenda de produtos aos presos rendeu R$ 2.942.582,36 ao Funpes (Fundo Penitenciário Estadual), entre 2019 e 2021. O recurso do fundo é usado exclusivamente em projetos em prol do preso e da unidade prisional, após aprovação de conselho deliberativo.

O funcionamento de cantina dentro dos presídios é regulamentado pela Portaria Normativa 27, publicada em agosto deste ano pela Agepen. Conforme o documento, a LEP (Lei de Execuções Penais) determina que os presídios tenham locais destinados à venda de produtos e objetos permitidos, mas não fornecidos pela administração. Nesta mesma lei, consta que “não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política” entre os presos.

Conforme a portaria da Agepen, a cantina será gerida por servidor. Ao fim de cada mês, ele deverá apresentar à administração da unidade prisional a prestação de contas, acompanhadas das notas fiscais dos produtos. Conforme o TAC em vigência, o lucro dos produtos comercializados na cantina não poderá ultrapassar 30%. Excluída a margem de lucro, deverão ser depositados no Funpes, no mínimo, 25% da arrecadação.

O detalhamento do que pode ser comercializado consta em documento encaminhado ao Campo Grande News. No grupo 1 (produtos alimentícios), estão 74 itens. Recentemente, foram liberados pizza (salgado assado), calabresa, bacon, salame, feijoada pronta e picolés industrializados.

A reportagem questionou a Agepen sobre as regras para seleção dos alimentos. Conforme a agência, os produtos comercializados nas cantinas obedecem às disposições contidas no Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público.

A reportagem solicitou ao MPMS o documento firmado com a Agepen, mas não obteve resposta até a publicação da matéria.

Histórico de problemas – A linha do tempo das cantinas dos presídios revela um histórico de irregularidades. Em 2009, quando o serviço era explorado pelos presos, relatório do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) apontou que a receita bancava despesas das unidades penais, mas também financiava facção criminosa.

Em 2010, a proposta foi passar a administração das cantinas para empresas terceirizadas. Em 2017, operação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) investigou a venda de produtos superfaturados na cantina da PED (Penitenciária Estadual de Dourados).

No ano passado, ex-diretor da Máxima (presídio Jair Ferreira de Carvalho) e um policial penal foram denunciados por usar parte do dinheiro arrecadado com a revenda de produtos aos presos para pagar duas multa de trânsito e festa, com direito a 300 canecas de chope personalizadas.

 

Segundo a denúncia, apurou-se que, entre junho de 2017 e fevereiro de 2019, os denunciados não realizaram o lançamento das notas fiscais da cantina no Siapen (Sistema Integrado de Administração do Sistema Penitenciário). Também não houve repasse para o Funpes, causando prejuízo de R$ 45.162,46. Os servidores foram afastados pela Agepen.(Campo Grande News)

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