Bom resultado em eleição local não garante desempenho 2 anos depois
Há vasos comunicantes entre as eleições municipais e gerais, 2 anos depois. Só que inexiste 1 padrão claro entre eleger prefeitos e vereadores e depois ter sucesso (ou fracasso) nas disputas para os cargos de governador, deputado e presidente. Cada contexto eleitoral tem uma idiossincrasia própria.
O Poder360 analisou os dados de eleitos por partido desde 2004.
O MDB, por exemplo, conquistou 18% das prefeituras brasileiras em 2012. Em 2016, a taxa foi de 19%. No mesmo período, o partido viu o número de deputados federais despencar. No PSDB também foi assim.
O PT perdeu 61% das prefeituras que tinha de 2012 para 2016, numa derrota acachapante que o colocou num patamar abaixo dos resultados que havia obtido em 2004. Era o 3º em número de prefeituras e passou a ser o 10º.
Logo depois, em 2018, o PT perdeu cadeiras na Câmara, assim como outros partidos tradicionais, mas elegeu novamente a maior bancada da Casa.
O infográfico abaixo permite comparar a força dos partidos nas eleições municipais X gerais. Fica clara a particularidade de cada pleito. O PSDB em 2016 elegeu 15% mais prefeitos do que em 2012 (799 ante 695). Mas viu o número de deputados federais cair quase pela metade de 2014 para 2018 (de 54 para 29).
O MDB é outro exemplo. Conquistou muitos municípios em 2008 (22%). E no pleito geral, 2 anos depois, perdeu deputados e governadores.
CIDADE DE SÃO PAULO
Há casos emblemáticos na história eleitoral brasileira quando se considera a cidade de São Paulo, a maior do país e sempre citada como laboratório de futuras eleições para governador e para presidente. Os resultados paulistanos corroboram a tese de que não existe uma lógica entre disputas locais e estaduais ou nacionais.
Em 1996, o Plano Real estava no auge. Debelou a inflação. Deu muita popularidade ao então presidente, o tucano Fernando Henrique Cardoso. O real valia cerca de US$ 1. Os brasileiros estavam com a autoestima nas alturas. Ainda assim, o candidato do PSDB a prefeito paulistano, José Serra, sequer conseguiu passar ao 2º turno (foram para a rodada final Celso Pitta, do PPB, e Luiza Erundina, do PT).
Só que a derrota tucana na cidade de São Paulo, em 1996, não impediu que o PSDB conseguisse reeleger FHC no 1º turno por mais 4 anos no Planalto na disputa de 1998. Para o governo paulista, o eleito foi o também tucano Mario Covas.
Já no ano 2000, Marta Suplicy, então no PT, conquistou a Prefeitura de São Paulo. Em 2002, Luiz Inácio Lula da Silva virou presidente da República. Também em 2002, o petista José Genoino teve expressivos 41,4% dos votos para governador paulista (quem venceu foi o tucano Geraldo Alckmin).
Com Marta na Prefeitura de São Paulo, Lula no Planalto e o PT tendo recebido muitos votos na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes, a impressão era a de que a sigla se organizava para num futuro próximo ter uma certa hegemonia paulista. Não deu nada certo.
Em 2004, Marta tentou se reeleger prefeita e foi derrotada pelo tucano José Serra. Em 2006, para o governo do Estado, apesar da alta popularidade do então presidente Lula, que foi reeleito, o PT fracassou na disputa pelo Bandeirantes. O governador eleito foi José Serra, derrotando o candidato do PT, Aloizio Mercadante, que teve apenas 31,7% dos votos –menos do que o petista Genoino havia obtido 4 anos antes.
Agora em 2020, a disputa na cidade de São Paulo está sendo apontada como réplica da polarização nacional entre direita e esquerda. O presidente Jair Bolsonaro demonstra simpatia pela candidatura de Celso Russomanno (Republicanos). O prefeito paulistano atual, Bruno Covas (PSDB), tenta a reeleição e seu sucesso (ou fracasso) será creditado ao governador paulista João Doria. O PT tem 1 candidato que até agora não decolou na disputa, Jilmar Tatto.
Os dados históricos sobre eleições municipais não indicam, entretanto, que a vitória de algum candidato seja necessariamente a garantia de bom desempenho daqui a 2 anos para os seus aliados nas eleições de governador e presidente. E o inverso também é verdadeiro.
RELAÇÃO ENTRE ELEIÇÕES
Para o professor do Instituto de Ciência Política da UnB (Universidade de Brasília) Paulo Calmon, os 2 anos que separam uma eleição da outra é suficiente para reviravoltas no cenário político.
Além disso, o contexto é diferente. Os temas, também. Nos pleitos municipais, segundo o professor, o eleitor está “preocupado com sua cidade, sentindo na pele o que funcionou ou não”. Já nas eleições gerais, a estrutura é maior, as propostas são mais flutuantes.
Calmon afirma que não há “relação clara” entre o número de prefeituras conquistadas por 1 partido e a capacidade de eleger deputados federais e governadores.
A estrutura de cada sigla –ampliada (ou não) com o resultado do pleito municipal– no entanto, pode influenciar as escolhas para governadores e presidente. “O fato dos partidos terem recursos organizacionais, financeiros, mobilização de pessoas, o fortalece durante a campanha presidencial”.
Segundo o cientista político, a relação interna no pleito geral é clara –diferente do que ocorre com as interferências municipais. “A eleição para Presidência da República, muitas vezes puxa, traz com ela, os governadores”. Para exemplificar o caso, o professor afirma que, em 2018, muitos candidatos se aliaram à agenda de Bolsonaro. E obtiveram sucesso. O mesmo aconteceu com Lula.
Esse fenômeno é conhecido como coattail effect, que é a tendência de 1 candidato popular atrair votos para outros de 1 mesmo partido em uma eleição. O termo foi originalmente popularizado por Barry Ames (1994).
Calmon pondera que o apoio do presidente da República a 1 postulante a prefeito não pode ser“desprezado”, mas não é “tão importante quanto [o apoio] nas eleições para deputados e governadores”.
PREFEITOS NO G96
Há uma peculiaridade quando se observam as prefeituras por partido nas 26 capitais e nos 70 municípios com mais de 200 mil eleitores –em que há 2º turno.
O MDB conquistou o maior número de cidades brasileiras em 2016 (como mostraram os infográficos acima). O PSDB, no entanto, comanda mais municípios importantes no chamado G96. Tem em suas mãos 21,2 milhões de eleitores em 30 cidades.
Tanto no infográfico acima, quanto nos publicados no início desta reportagem, percebe-se 1 ápice de eleitos do PT e do MDB em 2008. Os partidos tiveram relações próximas no período.
Em 2010, Michel Temer, emedebista, se candidatou a vice-presidente na chapa com Dilma Rousseff, do PT.
Essa estreita relação, vinda desde o governo Lula, alavancou a eleição de deputados e prefeitos entre filiados da sigla. O cientista político Paulo Calmon, já citado nesta reportagem, explica que a beneficiou ambos.
Depois, com escândalos de corrupção e uma intensa crise econômica, o PT foi perdendo poder. As prefeituras comandadas pelo partido caíram de 638 em 2012 para 254 em 2016.
As alianças de antigamente, segundo o professor, parecem não surtir mais tanto efeito. “Hoje, em grande medida, as alianças no congresso não orbitam em torno de partidos políticos, mas de bancadas e liderança. A influência do partido não acabou, mas cada vez mais está dividida”, diz.
Fonte: poder360