Omertà: Mulher de ex-guarda nega declarações dadas em depoimento gravado
Testemunha-chave da operação Omertà, contra grupo de extermínio atuante em Campo Grande, Eliane Benitez Batalha dos Santos, esposa do ex-guarda civil municipal Marcelo Rios, preso desde maio do ano passado, voltou atrás em sua versão sobre as acusações contra o marido de envolvimento em crimes de pistolagem, alvos da operação Omertà.
Nesta segunda-feira (2), durante audiência para ouvir testemunhas de acusação contra sete réus pela execução por engano de Matheus Coutinho Xavier, de 20 anos, ocorrida em abril de 2019, Eliane negou o conteúdo de depoimento dado à força-tarefa responsável pela investigação, pouco antes da operação. Ela retomou acusações contra a equipe do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco Assaltos e Sequestros).
Benitez, que chegou a pedir para ser colocada em programa de proteção à testemunha, na frente do juiz e promotores fez afirmações contrárias a praticamente de teor de 80 minutos de conversa com as autoridades, gravados, em agosto do ano passado, depois de procurar as autoridades para pedir ajuda por estar sob ameaça. As declarações foram usadas fartamente nas peças acusatórias aos réus da operação Omertà.
Ao contrário – Numa fala com muito choro em dado momento, ela relembrou o período de cinco dias no qual ficou em alojamento do Garras dizendo que nessa fase os filhos ouviram diversas vezes ameaças de que os pais seriam mortos. Reclamou de comer “comida de presídio” e disse ter sido impedida de manter contato com a família, mesmo quando os policiais aceitaram levá-la em casa para buscar roupas, por exemplo.
Eliane Benitez mudou inúmeros pontos-chave das declarações à força-tarefa, todos incriminadores do marido e dos outros investigados. No depoimento gravado no ano passado, admitiu que o marido era segurança de Jamil Name Filho, alvo da operação junto com o pai, Jamil Name, e disse que Rios ficou bastante nervoso na semana da morte de Matheus Coutinho Xavier e, ainda, que recebeu ameaças de pessoas ligadas à família Name logo depois dos fatos.
Hoje, negou tudo. Afirmou que não conhecia os Name, disse só ter tido contato com Jamilzinho quando precisou pedir ajuda à família. Afirmou, ainda, que jamais soube que o marido fazia trabalho de escolta ou segurança na casa dos empresários.
Segundo ela, Marcelo Rios tinha “vários bicos”. Sobre o trabalho com os Name, afirmou, chegava a mandar fotografias montando bonecas ou ajeitando cobertores para entrega a famílias.
Admitiu ter recebido 1050 reais de Jamilzinho, mas disse que esse valor era referente aos dias trabalhados pelo ex-guarda civil.
Outro ponto importante em que Eliane mudou sua fala foi com relação à informação relatada por ela, anteriormente, de que o marido estava nervoso após a morte de Matheus Coutinho Xavier e isso tinha a ver com o erro cometido, na contratação dos pistoleiros, atribuída a ele pelo trabalho investigatório. O alvo, segundo apurado, era o pai do rapaz, o policial militar Paulo Roberto Teixeira Xavier.
Nesta segunda, ela disse que Rios estava nervoso em razão do trabalho durante a Expogrande, por estar enfrentando problemas com a equipe de guardas contratada para atuar na feira rural. Essa informação surgiu agora. Também asseegurou nunca ter visto armamento em casa além do que o marido usava na Guarda Municipal.
Na gravação à força-tarefa, ela conta ter visto o arsenal apreendido com Marcelo Rios quando foi preso, em 19 de maio do ano passado.
Contraponto – Um dos policiais da investigação, o escrivão Giancarlos de Araújo e Silva, foi ouvido também na sessão de hoje e contrapôs as falas de Eliane quanto à estadia no Garras. Segundo ele, a mulher de Marcelo Rios foi procurada pela equipe policial a pedido do ex-guarda, por estar temendo pela vida dela, em razão de ameaças.
Como o caso era urgente, explicou o policial do Garras, mãe e filhos foram levados para a delegacia, onde ficaram em alojamento dos agentes de segurança, desocupado para abrigá-los, até que fosse viabilizada inclusão em programa de proteção à testemunha. A alimentação era providenciada pelos próprios policiais.
Mato Grosso do Sul não tem iniciativa específica para proteger testemunhas e por isso era preciso acionar o governo federal para tanto. Eliane ficou cinco dias na delegacia e, nesse intervalo, acabou desistindo de colaborar com as investigações, depois de o marido ser transferido para cela do CT (Centro de Triagem) Anízio Lima.
O agente de segurança lembrou que há vídeos de câmeras de segurança mostrando integrantes do grupo alvo da operação levando Eliane até um banco na avenida Júlio de Castilhos, onde entregaram dinheiro a ela, para que ficasse em silêncio sobre o que sabia, de acordo com os levantamentos.
De acordo com o policial, ela decidiu não permanecer na delegacia depois de conversar, por celular, com o advogado Alexandre Franzoloso. O profissional é réu em uma das ações da Omertà, justamente por coação de testemunha. A prisão dele chegou a ser solicitada, mas um habeas corpus foi concedido pelo TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) antes do cumprimento.
A alegação de tortura na delegacia chegou a ser apurada pela Corregedoria da Polícia Civil e foi arquivada, conforme apuração do Campo Grande News.
A audiência em que Eliane foi ouvida é a primeira do processo contra os réus pela morte de Matheus. As sessões continuam nesta terça-feira, pois são 13 testemunhas a serem ouvidas. Eram 15, mas duas foram dispensadas.
(As informações são do Campo Grande News)