Série Apito de Ouro – Por Marco Antonio Tavares

Todas as pessoas possuem uma história. Muitas são contadas de forma a dar uma conotação heroica, outras de terror, outras a despertar o carinho e admiração. As nossas, objetiva conhecer alguns personagens que ajudaram a construir um cenário que muitas vezes não são levados em conta, por não serem personagens que mexam com as emoções, que proporcionam choro ou mesmo, convulsões de alegria ou tristeza. Aqui, os envolvidos tem que tratar e conviver com a razão. Construiremos aqui uma série com o verdadeiro APITO DE OURO, onde contaremos histórias de árbitros, como forma a homenagear essas pessoas. E essas histórias deveriam começar assim….era uma vez…

 Daiane Caroline Muniz

Parece meu primeiro jogo. Eu toda acanhada no vestiário do Estádio Olímpico em Riobamba no Equador, cidade a 2.800 de altitude, onde farei na verdade o primeiro jogo já com o escudo da FIFA, que havia recebido há 9 dias atrás. Chovia, (mas já tinha passado muito frio com a neve que caia) e isso dava um certo ar de melancolia as minhas lembranças. Sou Daiane Caroline Muniz, assistente de futebol, conhecida por muitos como bandeirinha. Nada me dá mais medo do que cometer erros que não possam ser corrigidos. Apesar de sempre ter gostado de futebol, jogar e torcer, a escolha de uma nova carreira me punha esse temor, a incerteza se seria isso mesmo que queria para minha vida. Não sou de fazer nada que não seja o melhor, assim, essa escolha iria mudar minha rotina e por isso não podia ter dúvida. E não tive mais.

Em 2012 me inscrevi para o curso de formação de árbitros de futebol, na cidade de Três Lagoas em Mato Grosso do Sul, apesar de ser paulista de Santo André e viver grande parte de minha vida em Santa Fé do Sul, distante apenas 80 km e por isso mais perto de aproveitar as oportunidades. Era como se estivesse mudando de lado, agora eu julgava os jogadores e eles me tratavam por professora, que era mesmo na realidade, pois sou graduada em Educação Física. 

Começo a traçar parâmetros dos jogos em que estive presente e tão meteórica foi minha carreira. Em 2014 entro para o Quadro Nacional da CBF não antes de reprovar no teste físico. Isso sim me incomodava. Dei outra conotação aos treinamentos, passei a me dedicar a parte física como se fosse uma atleta, com uma boa alimentação e um planejamento de exercícios específicos, diminuindo a massa muscular. De 2012 a 2014 me aperfeiçoo nas partidas dos campeonatos amadores de Três Lagoas, terrão mesmo, ao mesmo tempo em que atuo nas partidas da Federação de Futebol de MS, quadro ao qual pertenço e que trabalhei em 4 finais consecutivas do Estadual da Série A.

Meu metabolismo começa a acelerar, está se aproximando a hora de subir ao gramado para o aquecimento, o coração bombeia mais sangue para controlar a adrenalina. O mesmo sentimento que senti em minha estreia no Brasileiro da Série A no estádio do Pacaembu, no jogo entre São Paulo x Santa Cruz. Naquele jogo, nos reunimos todos, árbitros e jogadores, no círculo central do gramado e por um minuto homenageamos todos que nos deixaram no voo trágico da Chapecoense acontecido dias atrás. Era 2016 e fiz também as estreias na Série B, C e D.

Voltamos do aquecimento e nos reunimos para mais uns ajustes da nossa equipe. Relembro alguns lances, algumas posições, checo minha bandeira e o rádio comunicador. Sinto o suor aumentar nas mãos. Reaperto o cabelo, arrumo minha tiara, olho no espelho e vejo uma vencedora………….

Minha escolha para participar do curso da FIFA foi muito em função dos cursos RAP-FIFA realizados pela CBF que foram pontes importantíssimas para o meu crescimento. O convívio com Árbitros de elite do país, árbitros dos maiores clássicos e das maiores experiências que um profissional pode galgar, realmente tem muito a transmitir. E sempre foi dessa forma que eu via esses cursos. Eu realmente vivia ali, a Comissão Nacional sempre com a mais alta dedicação para que cada vez mais pudéssemos estar estreitando a aplicabilidade das regras em campo de jogo.

Cada viagem de Três Lagoas a Campo Grande, dirigir 330 quilômetros até o embarque no aeroporto, jogo, viagem de volta a Três Lagoas, mais treinos, vídeos de jogos, uma rotina interminável. Acabou a execução dos hinos. Vamos ao jogo. Não farei nada que não seja o meu melhor.

Em 2018 entro para o quadro da FIFA e participo de três competições internacionais, Sul-americano sub-20, sub-17 e Libertadores Feminina. Nesse mesmo ano eu me mudo para a Capital. No ano seguinte realizo mais algumas competições internacionais dentre elas os jogos Panamericanos em Lima no Peru. Ainda em 2019, faço mais dois jogos na série A do Brasileirão, a final do campeonato Estadual de Pernambucano e pela quarta vez consecutiva, a final do nosso Estadual.

 

Adoro desafios, e acreditei em mais um, dessa vez reorganizo minha carreira de Assistente e vou começar uma nova jornada, ainda no futebol, decidi não mais bandeirar, agora vou apitar as partidas. Como sei a sensação dessa realização, irei trabalhar muito para merecer essa conquista novamente e chegar ao Quadro da FIFA. Consegui o primeiro passo e conquistei a vaga no Quadro da CBF, já um começo. Nada que não mereça o meu melhor.

Marco Antonio Tavares
Professor de Educação Física e

Vice-Presidente da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul

 

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